Descubra como o empreendedorismo por necessidade e as práticas de sustentabilidade estão transformando o Brasil.
Por Judá Nunes
O empreendedorismo é uma força vital que molda economias e sociedades, especialmente em tempos de mudança. Neste artigo, exploraremos o empreendedorismo de impacto social, o empreendedorismo por necessidade e como as pessoas trans estão renovando o mercado.
A adoção de práticas de sustentabilidade social e ambiental tornou-se um marco decisivo para investidores no Brasil. Há uma crescente valorização das questões ambientais, sociais e de governança (ESG) entre os investidores, refletindo uma mudança nas prioridades de investimento. Além disso, a pressão de autoridades e stakeholders está incentivando uma transformação objetiva no mercado empreendedor.
Como formadores de novos empreendedores, os profissionais que atuam na área de projetos da TODXS consideram essas mudanças do mercado investidor em seus programas. Um dos critérios avaliativos é a sustentabilidade financeira dos negócios apoiados, assim como seu potencial para impactar direta e indiretamente a comunidade LGBTI+ e a sociedade em que estão inseridos.
Leia também: O fomento ao empreendedorismo de impacto na comunidade LGBT+, no Papo de Responsa da Folha de São Paulo.
Muitos dos negócios selecionados para os nossos programas são tradicionais, principalmente nos ramos da beleza e alimentação. Observa-se que mesmo os empreendedores com modelos de negócios mais convencionais possuem uma visão e uma missão mais sustentáveis em relação ao meio ambiente e à sociedade. Quando isso é feito de forma intencional, podemos caracterizar como empreendedorismo de impacto social. Este tipo de empreendedorismo busca resolver problemas como pobreza, educação precária e degradação ambiental, promovendo uma transformação sistêmica nas relações entre pessoas, empresas e o meio ambiente, mesmo que em pequena escala.
Um exemplo notável é o Salão Escola Amanda Queiroz. Amanda Queiroz, uma travesti do Ceará, enfrentou preconceito e violência que dificultou seu acesso ao emprego formal. Após trabalhar em salões de beleza, decidiu empreender para conquistar autonomia financeira. No entanto, sua missão vai além da auto-sobrevivência. Desde o início do programa Fundo para Pessoas Trans e Travestis no primeiro semestre de 2023, Amanda já oferecia aulas preparatórias para mulheres cis, trans e travestis que vivenciaram violência de gênero, ensinando-as a atuar como cabeleireiras. Ainda no período de duração do projeto, ela estruturou seus cursos e formou mais de 30 pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica, oferecendo tudo gratuitamente.
Foto: Arquivo pessoal da Amanda Queiroz
Atualmente, Amanda Queiroz atende exclusivamente no salão, pois, devido à falta de investimento, precisou fechar a escola. No entanto, ela acredita que há planos para reabri-la no futuro, com uma abordagem mais amadurecida. Sobre sua participação no programa, ela afirma: “As mentorias foram essenciais para melhorar o espaço físico e aumentar o faturamento do meu salão. Comecei este ano com tudo organizado.”.
As pessoas que empreendem por necessidade, observado pela equipe de projetos, surgem em contextos onde as oportunidades de emprego para pessoas LGBTI+ , especialmente para pessoas trans são escassas. Muitas vezes, esses indivíduos se tornam empreendedores não por escolha, mas por necessidade econômica. Este fenômeno é comum em comunidades vulneráveis, onde a falta de alternativas leva à criação de negócios que atendem a demandas pessoais e locais — um verdadeiro cenário “ganha-ganha”.
As pessoas trans têm se destacado como empreendedores, trazendo novas perspectivas e abordagens ao mercado. Ao enfrentarem barreiras significativas no acesso ao emprego formal, muitas recorrem ao empreendedorismo como forma de autoafirmação e autonomia financeira. Além disso, criam espaços, bens e serviços que garantem a inclusão produtiva de outras pessoas trans, LGBTI+, negras e outros grupos vulnerabilizados.
Um estudo da FGV em parceria com a Fundação Arymax traçou o perfil dos empreendedores de impacto no Brasil, demonstrando que 94% dos empreendedores de impacto melhoram a vida de grupos desfavorecidos, enquanto 53% contribuem para melhorias ambientais. No contexto empresarial contemporâneo, as gerações millennials e Z emergem como catalisadoras de mudanças significativas no empreendedorismo, trazendo consigo uma abordagem única que incorpora valores de inclusão e responsabilidade social nas práticas comerciais. Essas gerações, profundamente conectadas digitalmente e orientadas por uma consciência social aguçada, estão redefinindo as dinâmicas comerciais, influenciando o mercado e promovendo uma transformação nas abordagens empresariais.
Essa transformação pode ser vista tanto como uma questão de visão de mundo, relacionada ao lugar social que as pessoas empreendedoras ocupam no mundo — onde valores como sustentabilidade e inclusão se tornam centrais nas decisões empresariais — quanto como uma transformação geracional, onde as expectativas em relação ao sucesso empresarial vão além do lucro financeiro. No entanto, é importante destacar que nem sempre o impacto social positivo nos negócios ocorre naturalmente; ele precisa ser incentivado, influenciado e direcionado.
À medida que avançamos, é essencial reconhecer a importância de apoiar iniciativas como o Fundo para Pessoas Trans, que oferece não apenas capital semente, mas também mentorias para acelerar negócios e indicar caminhos para a sustentabilidade financeira. O Fundo promove um impacto socioambiental positivo e escalável tanto para os empreendedores quanto para suas comunidades.
O Fundo para pessoas Trans e Travesti 2025.1 abre as inscrições amanhã, 29/01, dia nacional da visibilidade trans.
Se você é uma pessoa investidora que busca oportunidades que vão além do lucro financeiro, convidamos você a considerar um investimento responsável em projetos focados na inclusão produtiva. Essa combinação de abordagens pode ser a chave para um desenvolvimento econômico inclusivo e responsável, além de uma oportunidade única de alinhar o seu portfólio a valores éticos e sustentáveis. Entre em contato com: empreendedorismo@todxs.org |
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Sobre a autora –
Judá Nunes é parte do time que coordena os projetos de impacto e inclusão produtiva da TODXS. Há 9 anos trabalha com inovação social, especializou-se em Educação para Inclusão da Diversidade e em 2022 foi reconhecida como LinkedIn Top Voices Orgulho. Travesti e educadora, tem forte presença como gestora de projetos no terceiro setor, como conselheira do setor público e como consultora no setor privado. Foi destaque como mentora de um novo tempo, oferecendo insights sobre a dinâmica da diversidade no século XXI.
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