Chega de copiar fórmulas: projetos inclusivos precisam ser feitos sob medida

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Depois de entender o tamanho das barreiras enfrentadas por pessoas LGBTI+ no mercado de trabalho, vem a pergunta que mais escuto no terceiro setor: “o que fazer, então?”

A resposta simples seria: faça um curso, uma mentoria, uma capacitação.

Mas a resposta honesta é: faça um projeto sob medida. Escute, analise, ajuste. E depois escute de novo. Porque quando a gente fala de pessoas LGBTI+, especialmente travestis, pessoas trans, não-binárias, negras, com deficiência ou da periferia, não existe solução única.

Neste artigo, vou compartilhar aprendizados práticos para estruturar projetos que, de fato, promovam inclusão e empregabilidade com dignidade.

1. Escuta antes de tudo: entenda quem é seu público

Não tem como montar um bom projeto sem conhecer profundamente o público que será atendido. Isso não é só sobre identidade de gênero ou orientação sexual. É sobre história de vida, escolaridade, acesso à internet, situação familiar, saúde mental, renda, rotina.

Use entrevistas, formulários, rodas de conversa. Pergunte com respeito:

  • O que essa pessoa já tentou e não deu certo?
  • Quais barreiras ela enfrenta hoje?
  • O que ela quer conquistar a curto, médio e longo prazo?

Projetos inclusivos não começam com uma planilha. Começam com gente.

2. Metodologia importa e precisa ser flexível

Pessoas trans e outras identidades dissidentes já enfrentam pressões emocionais e sociais intensas. Cobrar presença rígida, exigir câmeras ligadas o tempo todo ou usar jargões corporativos demais pode excluir logo na largada.

Aqui vão algumas abordagens que funcionam bem:

📌 Problem Based Learning (PBL)

Ajuda participantes a resolver desafios reais com base em suas vivências. É aprendizado com propósito.

📌 Microlearning

Pequenas doses de conteúdo que cabem na rotina de quem tem pouco tempo ou divide o celular com a família.

📌 E-learning com acessibilidade

Plataformas que funcionem em celular, com legenda, audiodescrição e linguagem direta.

📌 Sala de aula invertida (Flipped Classroom)

Conteúdo acessado antes, encontros ao vivo usados para tirar dúvidas e compartilhar experiências.

E o mais importante: testar e adaptar. O que serve para um grupo pode não servir para outro. Flexibilidade é regra.

3. Projetos precisam ser afetivos (sem perder a técnica)

Não adianta só ensinar currículo e LinkedIn se a pessoa ainda carrega traumas de exclusão. Muitos dos participantes LGBTI+ chegam com autoestima abalada, sem referências positivas no mercado de trabalho e com medo de “não dar conta”.

Por isso, além do conteúdo técnico, um bom projeto de empregabilidade precisa:

  • Incluir tutoria individualizada;
  • Promover acolhimento e escuta ativa;
  • Fortalecer redes de apoio entre participantes.

Empregabilidade não é só habilidade, é segurança, pertencimento, reconstrução da autoestima.

4. Prepare também quem vai contratar

Você pode formar os melhores talentos, mas se o ambiente de trabalho for hostil, o ciclo de exclusão continua.

Por isso, o projeto também precisa atuar com as empresas e equipes que vão receber essas pessoas.

Isso significa:

  • Treinar lideranças e RH sobre diversidade e inclusão;
  • Estabelecer acordos claros sobre uso de nome social, banheiros, dresscode, etc.;
  • Criar canais seguros para denúncias e suporte psicológico.

Sem esse trabalho de base, você corre o risco de incluir alguém para depois ver ela sendo excluída de novo, mas agora com mais uma frustração nas costas.

5. Documente, meça, aprenda

Cada edição do projeto é uma oportunidade de aprender. Mas só dá pra aprender de verdade se você acompanhar:

  • Frequência e engajamento;
  • Feedbacks qualitativos;
  • Casos de sucesso e de abandono;
  • Dados de entrada e saída (ex: renda antes e depois, autopercepção de habilidades, etc.).

Sem avaliação, não existe evolução. Documente tudo. Isso vai ajudar a ajustar o projeto e também a prestar contas para apoiadores e patrocinadores com mais força.

No próximo artigo…

Vamos falar sobre impacto. Como medir se um projeto realmente transformou vidas? Quais indicadores fazem sentido quando falamos de pessoas LGBTI+? E como garantir que esse impacto seja contínuo, mesmo depois do encerramento da turma?

Te espero na Parte 3 dessa série.

Até lá! 🧩 Se você já desenvolveu um projeto com foco em empregabilidade, me conta: qual foi o maior desafio?

Judá Nunes é parte do time que coordena os projetos de impacto e inclusão produtiva da TODXS. Há 9 anos trabalha com inovação social, especializou-se em Educação para Inclusão da Diversidade e em 2022 foi reconhecida como LinkedIn Top Voices Orgulho. Travesti e educadora, tem forte presença como gestora de projetos no terceiro setor, como conselheira do setor público e como consultora no setor privado. Foi destaque como mentora de um novo tempo, oferecendo insights sobre a dinâmica da diversidade no século XXI.

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